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Como os seres marinhos podem nos fornecer informações relevantes sobre o mar

Atualizado: 1 de dez. de 2021

Autores: Filipe Guilherme Ramos Costa Neves, Mariana P. Haueisen, Thais R. Semprebom e Douglas F. Peiró



Fotografia da ostra do gênero Crassostrea, disposta em vários perfis: externamente, de lado, de frente, internamente.

Crassostrea sp., gênero de bivalve encontrado em regiões costeiras e utilizado como bioindicador da qualidade da água e dos ambientes costeiros. Na imagem, estão vários perfis das duas valvas do bivalve. Fonte: Llez/Wikimedia Commons (CC BY-SA 3.0).



Há um recorrente questionamento sobre as nossas atitudes como seres humanos frente à causa ambiental. Muitos cientistas e várias pessoas na sociedade ao redor de todo o mundo estão preocupados com o futuro da humanidade. Aumento populacional, demanda crescente por alimento, expansão da agricultura e consequente desmatamento florestal, perda da diversidade de seres vivos, destruição de manguezais, aumento da temperatura no planeta, enfim, uma lista de problemas que são muito discutidos e para os quais devemos ficar em alerta.


Além da importância para todos os seres vivos, nós, seres humanos, dependemos dos sistemas ecológicos, especialmente do mar, por uma série de fatores. A manutenção do clima terrestre, por exemplo, é dependente dos ecossistemas. Florestas e, mais significativamente o fitoplâncton, fornecem uma grande quantidade de oxigênio para a atmosfera, assim como retiram grande parte do dióxido de carbono, sendo este gás um dos responsáveis pelo efeito estufa.


Os recifes de corais e manguezais oferecem para as costas dos continentes proteção contra as ondas e marés, amenizando que a região costeira sofra erosão. Não somente isso, os manguezais também filtram boa parte dos nutrientes que vêm com os rios da drenagem continental e, de outro modo, chegariam ao mar em grandes quantidades. Assim, grandes concentrações de nutrientes poderiam causar eutrofização e, consequentemente, problemas de hipóxia e anóxia (isto é, pouca concentração de oxigênio e/ou nenhuma oxigenação, respectivamente) de águas costeiras, um problema observado em alguns ambientes marinhos ao redor do mundo.


As regiões costeiras são locais de recreação e também de fontes de trabalho para uma boa parte da população que vive no litoral. Também muitos utilizam a praia para estabelecer seu comércio e dali retirar recursos para sua sobrevivência.


E o que dizer do mar aberto, que é o local onde há grande diversidade e abundância de peixes de valor comercial? As sardinhas, as albacoras, barracudas, tubarões são pescados e fazem parte das refeições de muita gente. O fundo do mar, local escuro, inóspito para uma variedade de organismos, abriga lá uma das mais utilizadas fontes de energia atuais, o petróleo.


Como, então, analisar a qualidade desses sistemas ecológicos de tão grande importância?



Fotografia da areia do mar com alguns buracos de onde foram retirados os vermes poliquetos que ficam internamente no sedimento. Esses vermes estão dispostos ao lado dos buracos.

Poliquetos, vermes marinhos encontrados no sedimento e que podem servir como bioindicadores de substâncias químicas presentes no ambiente bentônico. Fonte: Hans/Pixabay.



BIOINDICADORES


Os bioindicadores são organismos, partes de organismos ou mesmo comunidades de organismos que podem definir a qualidade do ambiente em questão. Sendo assim, os bioindicadores servem para destrinchar grande parte do conteúdo informativo dos biossistemas, de modo que seja possível avaliar a qualidade de toda uma área. Por exemplo, as florestas de coníferas, alguns besouros e alguns pássaros são exemplos de bioindicadores.


É importante que os programas de biomonitoramento tenham equipamentos auxiliares, que avaliem aspectos físicos e químicos do ambiente. No entanto, tais equipamentos são auxiliares. Eles servem para acessar dados apenas no momento de sua utilização. O uso de seres vivos é essencial para avaliar aspectos espaciais e temporais de um ecossistema.


Detergentes, substâncias oleosas, material orgânico, plásticos, metais pesados podem chegar ao mar pelos estuários, provocando uma cadeia de demandas sobre os vários organismos marinhos. Alguns respondem mais rápido a tais compostos e em curto prazo, outros são mais lentos e respondem em longo prazo. A partir dessas respostas podemos, então, averiguar as condições de um meio.


Recentemente, alguns pesquisadores do Nordeste brasileiro fizeram um estudo de monitoramento do plâncton na região costeira, após o derramamento de óleo no oceano. Eles encontraram vários crustáceos planctônicos, como os copépodes e decápodos, envoltos em pequenos fragmentos de óleo e a presença do composto no trato digestivo desses animais. Assim, essa fauna pode ser indicadora do derramamento de óleo, servindo para avaliar a qualidade do ambiente. Não somente isso, mas alguns copépodes têm até a capacidade de degradar o óleo, auxiliando assim na recuperação do ambiente ao seu estado de equilíbrio, devolvendo-lhe a capacidade de fornecer seus serviços ecossistêmicos.


Os bioindicadores podem ser:


  • Quanto ao ambiente/condições em que vivem:

- Ativos: usados em estudos de ecotoxicologia, são criados em laboratório e expostos a condições encontradas no ambiente por um período de tempo. Após isso, são registradas as reações e/ou os produtos retirados do organismo para serem analisados.

- Passivos: quando os organismos já existem no ambiente e são avaliados nele, conforme suas reações a mudanças no meio.


  • Quanto à utilidade de bioindicação:

- Acumulativos: organismos que acumulam um ou mais elementos e/ou compostos químicos do ambiente.

- De efeito ou de impacto: são organismos que demonstram efeitos específicos em resposta a determinado elemento ou composto químico, ou a um número específico de substâncias.


Agora que sabemos um pouco mais sobre o conceito de bioindicadores, quais organismos têm sido usados como indicadores da qualidade dos ecossistemas marinhos?



BIOINDICADORES MARINHOS


Muitos organismos marinhos já foram utilizados como bioindicadores em vários estudos de monitoramento e ecotoxicologia.


As bactérias são indicadoras do estado trófico (alimentar) dos ambientes. São encontradas em ambientes impactados, especialmente aqueles sujeitos à eutrofização. Algumas bactérias epífitas, ou seja, aquelas que vivem aderidas a alguma superfície, podem ser responsáveis por acumular metais pesados em ecossistemas.



Fotografia de vários conjuntos de pequenas bolinhas azuis coloridas artificialmente em azul, representando as bactérias marinhas, presentes em um ambiente azul-escuro.

Aglomerações de uma bactéria encontrada no ambiente marinho. Essas células são indicadoras de eutrofização, sendo bastante abundantes em águas com grandes quantidades de nutrientes, como compostos de nitrogênio e fósforo. Fonte: Anthony D’Onofrio/Flickr (CC BY 2.0).



As microalgas tendem a responder rapidamente às alterações do ambiente, sendo grandes candidatas à bioindicação dos ecossistemas marinhos. A comunidade fitoplanctônica pode indicar mudanças climáticas, já que estas influenciam a comunidade em termos da taxa de crescimento da célula, abundância, composição e distribuição de seus táxons.


Os moluscos bivalves são frequentemente usados em estudos de poluição, pois são bons acumuladores de metais. Por exemplo, a espécie Crassostrea brasiliana já foi usada como bioindicadora de poluição por metais na costa do Rio de Janeiro (Brasil), onde ajudou a identificar os locais de grande despejo industrial. Uma outra espécie, a Crassostrea rhizophorae já foi usada no Maranhão e na Bahia como indicadora de poluição, inclusive por mercúrio.


Assim como esses moluscos, os embriões e larvas de outros invertebrados marinhos podem também ser bons bioindicadores. Os ouriços-do-mar têm servido como modelos em estudos celulares, que procuram avaliar suas reações diante de estresses na fase de desenvolvimento e diferenciação da célula. Além deles, os crustáceos tendem a acumular grandes quantidades de metais pesados em seus tecidos e, mesmo assim, sobreviver em ambientes poluídos. Vale ressaltar que os crustáceos são parte da dieta de uma variedade de organismos marinhos, o que pode ocasionar biomagnificação (acúmulo de substâncias em níveis superiores da teia trófica) de tais substâncias e compostos químicos e chegar a causar danos à saúde humana.



Microfotografia de uma larva de equinodermo, chamada pluteus, com vários apêndices dispostos para cima. Ela apresenta um corpo levemente retangular.

Larva de ouriço-do-mar (chama-se pluteus). Ela é indicadora de metais como ferro, cádmio, cobre, chumbo e zinco. Fonte: Otto Larink/Wikimedia Commons (CC BY 3.0).



Quem nunca ouviu falar que as aves marinhas sinalizam a proximidade da região costeira, seja de uma ilha ou de um continente? Até as aves marinhas têm sido utilizadas como bioindicadores para os ecossistemas marinhos. Elas respondem rapidamente a mudanças ambientais, como o seu hábito de migração diante de condições climáticas desfavoráveis, e também demonstram sua ocorrência com a vocalização, sendo fáceis de detectar e identificar. Elas são utilizadas como bioindicadores de poluição, derramamento de óleo, mudanças climáticas e até da produtividade marinha, sendo encontradas em grandes quantidades em locais onde há grande quantidade de alimento como peixes.



Foto de sete aves marinhas em uma montanha de coloração verde a marrom voltadas com o bico para o chão. Elas estão como que à procura de alimento. Ao fundo veem-se as águas do mar.

Aves marinhas forrageando em um ambiente rochoso repleto de plantas. Essas aves, além de indicarem a proximidade do continente, podem servir como indicadoras de poluição. Fonte: Ivy105/Pixabay.



O assunto e o objetivo dos estudos com bioindicadores revelam um conteúdo promissor para a avaliação da qualidade do meio ambiente. É necessário que esforços sejam empregados para uma interação mais integrada entre os cientistas ao redor de todo mundo. Isso é extremamente importante para unir forças em direção a uma biosfera mais sustentável. Assim, nossas ações atuais irão permitir que as gerações futuras desfrutem da qualidade dos ambientes como também de seus serviços ecossistêmicos.



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Bibliografia


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