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Poríferos: simples, mas nem tanto

Atualizado: 1 de abr. de 2021

Autores: Fernanda Cabral Jeronimo, Raphaela A. Duarte Silveira, Thais R. Semprebom, Aline Pereira e Douglas F. Peiró



Fotografia de uma esponja de cor amarela em formato tubular, com uma abertura para a região interna que é oca. A abertura encontra-se na extremidade superior de cada "tubo", ou seja, cada indivíduo. Na foto há quatro indivíduos da mesma espécie.

A esponja Aplysina fistularis, conhecida como esponja-tubular-amarela, é comumente encontrada no litoral brasileiro. Fonte: Nick Hobgood/Wikimedia Commons (CC BY-SA 3.0).



O Filo Porifera é um dos mais antigos do Reino Animal, com registros fósseis de cerca de 600 milhões de anos, no período pré-cambriano. Os representantes desse filo são popularmente conhecidos como esponjas e são animais multicelulares, com organização corporal simples (sem tecidos especializados), bentônicos, sésseis e filtradores. O personagem de desenho Bob-esponja é justamente uma representação estilizada destes animais. Estão globalmente distribuídos em ambientes aquáticos (água doce, salgada e salobra), sendo que a maior parte deles vivem predominantemente no ambiente marinho, podendo ser encontrados em até 8.600 metros de profundidade.


Porífero significa dotado de poros, uma característica marcante das esponjas. As diversas aberturas presentes no seu corpo permitem a circulação de água, que carreia alimento e oxigênio para o seu interior e, que após o processamento, é expelida com metabólitos e excretas. Esse é um mecanismo muito vantajoso para um animal séssil, ou seja, que não se locomove, já que a filtragem é otimizada. O tamanho de uma esponja pode variar de milímetros até 2 metros de diâmetro, além de exibir uma variedade de formas e cores.


Atualmente são descritas mais de 8.500 espécies de esponjas, distribuídas em três classes: Hexactinellida, Calcarea e Demospongiae, sendo que a última representa 95% de todas as esponjas e é a única classe com representantes na água doce. Alguns autores consideram, ainda, uma quarta classe, a Homoscleromorpha, que era classificada como uma família dentro da classe Demospongiae. Além disso, as esponjas também podem estabelecer associações com outros animais, como caranguejos, moluscos e peixes, que podem conviver de forma harmônica ou parasitária, dentro ou sobre as esponjas.



A fotografia mostra um peixe de cor azul e marrom, ambos opacos, beliscando a superfície da esponja, que tem formato irregular, dotada de poros, que possui cor marrom escuro.

Peixe cirurgião-chocolate (Acanthurus pyroferus) sobre a esponja-marrom (Spheciospongia vagabunda). Fonte: Bernard DUPONT/Wikimedia Commons (CC BY-SA 2.0).



FUNÇÃO CELULAR E ESTRUTURA CORPORAL


As esponjas são animais biologicamente simples. O agrupamento de células que compõem esses organismos demonstram certo grau de independência e são especializadas para as funções que designam. No entanto, não formam tecidos verdadeiros, órgãos internos nem mesmo sistema nervoso.


Sua estrutura corporal é organizada em três camadas. A camada mais externa é denominada pinacoderme, composta por células achatadas chamadas pinacócitos, que possuem a função de revestir a esponja e secretar um material que auxilia na sua fixação ao substrato. A segunda camada é denominada mesohilo ou mesogleia, uma substância gelatinosa composta por proteínas. Nesta camada estão localizados os esclerócitos, células responsáveis por secretar elementos esqueléticos chamados de espículas, responsáveis por estruturar as esponjas. As espículas podem ser de origem orgânica (fibra chamada espongina) ou inorgânica (carbonato de cálcio ou sílica). Além disso, o mesohilo também abriga células responsáveis pela reprodução, chamadas ovócitos, e células responsáveis pela regeneração e digestão, chamadas amebócitos.


Por último, a terceira camada é denominada de coanoderme, assim chamada por abrigar os coanócitos, células morfologicamente adaptadas para gerar correntes de água e captar partículas de nutrientes. A porção ovoide da célula é apoiada no mesohilo e a porção composta por um colarinho e um flagelo ficam expostas à cavidade interna da esponja. Dessa forma, o batimento do flagelo produz uma corrente de água e as partículas de nutrientes ficam retidas no colarinho, que se assemelha a uma peneira. Finalmente, os coanócitos fagocitam as partículas e as direcionam para os amebócitos, responsáveis por digeri-las.



Desenho esquemático da estrutura corporal celular de uma esponja. A cama mais externa possui células em formato de elipse. A camada interna é representada por uma substância sólida com células arredondadas e amebóides imersa em seu interior. Já a camada mais interna apresentam células um pouco mais especializadas, com uma porção arredondada e a outra em formato de cesto, de onde sai um flagelo que se assemelha a uma corda.

Esquema demonstrando a organização celular de organismos do filo Porifera. A seta azul indica o fluxo de água. Fonte: modificada a partir de Xvazquez and Lilyu/Wikimedia Commons (CC0).



A morfologia geral das esponjas é semelhante a um barril, porém outros formatos também estão presentes. A comunicação com o meio externo se dá por pequenos poros, denominados óstios, que se ligam à cavidade no interior do organismo, chamada átrio ou espongiocele. A abertura no topo é denominada ósculo, por onde passa a água eliminada pelo animal. Além disso, existem três diferentes tipos de estruturas corpóreas internas, classificadas de acordo com a complexidade de seus canais hídricos, originados a partir do dobramento da parede corporal:

  • Ascon: estrutura simples e tubular, flagelos no átrio, sem presença de canais.

  • Sicon: aparecimento de canais flagelados.

  • Leucon: complexo canal hídrico, ramificado, com formação de câmaras flageladas.



Esquema representando os três diferentes tipos de estruturas corpóreas de esponjas. A primeira, em formato de taça, possui o centro grande e oco, com pequenos canais que ligam o meio externo ao interno. A segunda possui o formato de uma taça um pouco mais rasa e maior número de canais, que se ramificam. Já a terceira possui o centro oco menor devido ao aumento de complexidade de canais hídricos, que se ramificam, se comunicam e até formam câmaras.

Esquema representando diferentes estruturas corpóreas internas de esponjas. A porção amarela representa a pinacoderme, a cinza representa o mesohilo e a vermelha, a coanoderme. A seta azul indica o fluxo de água. Fonte: modificada a partir de Philcha/Wikimedia Commons (CC BY-SA 3.0).



REPRODUÇÃO


Os poríferos são hermafroditas e a sua reprodução pode ocorrer de forma sexuada ou assexuada. A reprodução sexuada ocorre a partir da liberação de gametas pelos indivíduos, que são fecundados e originam uma larva livre natante, que buscará um substrato adequado para fixação e desenvolvimento. A reprodução assexuada resulta na formação de um novo indivíduo a partir de brotamento (externo), gemulação (broto interno) e regeneração de fragmentos desprendidos.



IMPORTÂNCIA ECOLÓGICA E ECONÔMICA


Por formarem relações simbióticas com outros organismos, os impactos antrópicos sofridos pelas esponjas também afetam uma série de organismos que dependem delas para sobreviver. As esponjas fornecem abrigo, proteção, alimento e possibilidade de camuflagem para animais que frequentam os ambientes onde estão localizadas. Atividades como a pesca de arrasto de fundo e a presença de oleodutos comprometem a sobrevivência das esponjas, que desempenham papéis importantes no ambiente marinho.


Os poríferos incorporam toneladas de carbono do ambiente marinho e também participam da ciclagem do nitrogênio. Além de contribuir para a cimentação de recifes, as esponjas são bioindicadores de poluição, já que são sésseis, filtradores e sensíveis a alterações de parâmetros ambientais. Portanto, a presença desses animais no ambiente indica a boa qualidade da água.


No âmbito econômico, podem ser utilizadas como uma alternativa biodegradável à esponja de banho. Mas cuidado, nem todas as esponjas são apropriadas para isso, pois possuem as espículas (estruturas de sustentação podem espetar o corpo) e as que são apropriadas para isso não podem ser simplesmente retiradas do ambiente marinho (uma boa alternativa seria cultivá-las para esta finalidade específica - entretanto carece de estudos). Além disso, as esponjas produzem substâncias bioativas, como enzimas, que são extraídas e podem servir de componentes para medicamentos e até mesmo quimioterápicos, com destaque para o tratamento de câncer de mama. Ou seja, de simples as esponjas não têm nada!




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Bibliografia


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